Conjunto de Vitali

Na matemática, um conjunto de Vitali é um subconjunto dos números reais, que pode ser construído, mas cuja existência é consequência do axioma da escolha, e que serve como contra-exemplo para várias propriedades ou como bloco construtor de vários paradoxos.

Em resumo, ele é um conjunto de números reais tal que qualquer número real é a soma de um único elemento dele e um único número racional.

Construção

Seja x y {\displaystyle x\sim y\,} a relação em [ 0 , 1 ] R {\displaystyle \left[0,1\right]\subset \mathbb {R} \,} definida por x y x y Q {\displaystyle x\sim y\Leftrightarrow x-y\in \mathbb {Q} \,} . Como essa relação é de equivalência, podemos escolher (e nesse ponto estamos conjurando o axioma da escolha) um representante de cada classe de equivalência. O Conjunto de Vitali é esse conjunto formado pelos representantes de cada classe de equivalência.

Aqui cabe uma observação: o axioma da escolha garante que esse conjunto existe, mas não garante que ele seja único; então devíamos dizer um (em vez de o) Conjunto de Vitali.


O conjunto de Vitali não é mensurável a Lebesgue

Denote por V {\displaystyle V\,} um conjunto de Vitali e por μ {\displaystyle \mu ^{*}\,} a medida exterior de Lebesgue.

Considere { r j } j = 1 {\displaystyle \{r_{j}\}_{j=1}^{\infty }\,} uma enumeração para [ 1 , 1 ] Q {\displaystyle [-1,1]\cap \mathbb {Q} \,} e construa o conjunto:

S = j = 1 ( V + r j ) {\displaystyle S=\bigcup _{j=1}^{\infty }(V+r_{j})\,} , onde:
V + r j = { x + r j : x V } {\displaystyle V+r_{j}=\{x+r_{j}:x\in V\}\,}

Vamos mostrar agora as inclusões:

[ 0 , 1 ] S [ 1 , 2 ] {\displaystyle [0,1]\subseteq S\subseteq [-1,2]\,}

Da forma como foi construído o conjunto, temos:

V [ 0 , 1 ] {\displaystyle V\subseteq [0,1]\,}

Então, se x V {\displaystyle x\in V\,} e r j [ 1 , 1 ] {\displaystyle r_{j}\in [-1,1]\,} , vale x + r j [ 1 , 2 ] {\displaystyle x+r_{j}\in [-1,2]\,} .


Agora, seja x [ 0 , 1 ] {\displaystyle x\in [0,1]\,} . Então, existe y V {\displaystyle y\in V\,} tal que x y {\displaystyle x\sim y\,} , ou seja, x y = r , r Q {\displaystyle x-y=r,\,r\in \mathbb {Q} \,} .

Como x , y [ 0 , 1 ] {\displaystyle x,y\in [0,1]\,} , temos que r [ 1 , 1 ] {\displaystyle r\in [-1,1]\,} e r = r j {\displaystyle r=r_{j}\,} para algum j {\displaystyle j\,} . Logo, x S {\displaystyle x\in S\,} .


Vamos mostrar agora que os conjuntos V + r j {\displaystyle V+r_{j}\,} são disjuntos. Para tal, considere um elemento x {\displaystyle x\,} na intersecção de dois destes conjuntos:

x ( V + r i ) ( V + r j ) {\displaystyle x\in \left(V+r_{i}\right)\cap \left(V+r_{j}\right)\,}

Então:

x = y + r i = z + r j {\displaystyle x=y+r_{i}=z+r_{j}\,} com y , z V {\displaystyle y,z\in V\,}

Logo:

y z = r j r i Q y z {\displaystyle y-z=r_{j}-r_{i}\in \mathbb {Q} \Longrightarrow y\sim z\,}

Como o conjunto de Vitali foi construído tomando apenas um elemento de cada classe de equivalência, y = z {\displaystyle y=z\,} , o que implica r i = r j {\displaystyle r_{i}=r_{j}\,} e, portanto, i = j {\displaystyle i=j\,} .

Finalmente, podemos provar que V {\displaystyle V\,} não é mensurável. Partimos da estimativa:

μ ( [ 0 , 1 ] ) μ ( S ) μ ( [ 1 , 2 ] ) {\displaystyle \mu ([0,1])\leq \mu ^{*}(S)\leq \mu ([-1,2])\,}
1 μ ( j = 1 ( V + r j ) ) 3 {\displaystyle 1\leq \mu ^{*}\left(\bigcup _{j=1}^{\infty }(V+r_{j})\right)\leq 3\,}

Para terminar o resultado considere V {\displaystyle V\,} mensurável e observe que a medida de Lebesgue é σ {\displaystyle \sigma } -aditiva e invariante por translações. O que nos leva à seguinte expressão:

1 j = 1 μ ( V ) 3 {\displaystyle 1\leq \sum _{j=1}^{\infty }\mu (V)\leq 3\,}

O somatório é finito apenas se μ ( V ) {\displaystyle \mu (V)\,} for nulo, caso em que a soma é também nula e portanto inferior a 1.